Muita gente tem o sonho de morar um tempo fora do país, para estudar e/ou trabalhar. Pensando nisso, achei que seria legal fazer uma postagem sobre como é esse processo, as alegrias e os desafios. E como o foco aqui é a França, quem melhor do que uma pessoa que morou e estudou em Paris? Vanessa Santos é graduada em psicologia pela UFRJ e resolveu que seu mestrado em psicanálise seria feito na Université Paris Diderot. Ela compartilhou essa experiência no blog 300 dias em Paris, que vale muito a pena ser lido! Segue a entrevista. Espero que seja útil! 😉
Como surgiu o interesse em estudar na França?
Vanessa Santos: Eu sempre quis conhecer a França, não me lembro muito bem desde quando. Tive a oportunidade de ir como turista em 2011, fiquei apaixonada por Paris e doida para voltar. Aí, um belo dia, ouvi uma colega de estágio falando que ia morar lá e fazer um Master em psicanálise. A partir daí, fiquei obcecada com essa possibilidade. Decidi que tinha que morar em Paris e que iria unir o útil ao agradável, ou seja, fazer também um Master na minha área profissional, a psicanálise, que é muito forte na França.
Você já dominava a língua ou fez algum curso na época?
VS: Não exatamente. Tinha feito um curso de francês na Wizard por dois anos, mas quando cheguei lá na viagem em 2011 percebi que não sabia grande coisa. Como não tinha muito tempo para fazer anos de curso, contratei uma professora particular de francês, que era aquela colega de estágio que tinha ido morar em Paris e já tinha voltado. Estudei com ela por um ano e alguns meses e aprendi muito, não só de francês, mas da vida lá e do processo de candidatura e do Master. Esse tempo com ela foi essencial, me ajudou muito com tudo.
Como foi o processo seletivo da Université Paris Diderot? O curso é gratuito ou foi necessário pagar?
VS: O processo seletivo foi exatamente como descrito pelo Campus France, que é um órgão do governo francês que faz a ponte entre os estudantes estrangeiros e as universidades francesas. É um processo cheio de etapas e burocracias e se gasta muito dinheiro nele, mas você sabe cada detalhe de como vai ser desde o começo porque eles tem um sistema muito organizado e te esclarecem todas as dúvidas que você tiver. No site do Campus France Brésil, tem um manual com o passo a passo do processo que é leitura obrigatória para quem quer estudar lá.
Quanto ao curso, ele não é gratuito. Em 2014, paguei em torno de 500 euros numa taxa única que cobre um ano de estudos mais a sécurité sociale, que funciona basicamente como um plano de saúde para estudantes de até 26 anos e é obrigatório.
É muito burocrático/caro conseguir o visto de estudante? Com ele você pode exercer algum tipo de atividade remunerado ou apenas estudar?
VS: O visto em si não é tão burocrático e nem caro, você basicamente reúne todos os documentos listados no site do consulado e leva no dia agendado pelo site. Só que tem que ter todos os documentos mesmo, e não adianta tentar enganar o consulado de forma alguma porque eles já conhecem os truques e são super rígidos, principalmente com relação à comprovação de renda (sua ou do seu responsável financeiro) e ao motivo de sua viagem, porque neste caso é preciso já ter a carta de aceite da universidade. O meu visto era de 12 meses e eu tinha uma autorização para trabalhar até 21 horas por semana.
Como foi conseguir uma moradia?
VS: Não foi difícil como tinha visto nas minhas pesquisas. Foi fácil, aluguei pela Paristay, uma imobiliária que só aluga para estrangeiros (tem a Lodgis e a Paris Attitude também, que são mais baratas até), então não exigem o famoso fiador francês que resida na França há pelo menos dois anos e que tenha uma renda de três vezes o valor do aluguel. Eles pedem isso também, mas o fiador não precisa ser francês, pode ser seu pai ou mãe. Só que foi bem caro, pois tive que pagar o primeiro mês de aluguel, mais a comissão da imobiliária, que não lembro quanto foi, mas não foi barata, e ainda o seguro residencial, que também foi caro. O processo é simples, você pesquisa o apartamento no site deles, envia uma proposta de aluguel, eles te retornam com a lista de documentos, você envia e eles te passam a resposta do proprietário. Aí é só pagar tudo e assinar o contrato.
O que achou do ambiente em sala de aula? Conseguiu fazer amigos no tempo em que morou lá? Sofreu preconceito por ser brasileira?
VS: O ambiente em sala de aula era tranquilo. Não sofri preconceito algum por ser brasileira, e de qualquer forma tinha muitos estrangeiros na sala. Sempre fui muito bem tratada por todos os estudantes franceses com quem falei na faculdade, mas uma coisa que percebi, que não posso dizer que é igual em todos os lugares, claro, mas que aconteceu comigo, foi que os franceses não se enturmavam com a gente, ou talvez a gente não se enturmasse com eles. Eles tinham seus grupos de amigos, e os brasileiros formavam seu próprio grupo. A interação era quase inexistente.
Quanto tempo morou na França? O que achou da experiência?
VS: Morei lá por uns 11 meses e concluí o Master de Psicologia, na especialidade Psychanalyse et recherches interdisciplinaires. Foi uma experiência extremamente enriquecedora, mais pessoalmente do que profissionalmente, para ser sincera. Mas não foi fácil, nem um pouco, e passei por belos perrengues e me decepcionei com algumas coisas. É tipo viver a realidade mesmo. Às vezes a gente vai pra lá com uma fantasia em que tudo vai ser perfeito e lindo, como um conto de fadas, e na verdade é uma vida fora do nosso país, com trabalho e estudo, e dificuldades com o idioma e burocracias, e saudades de casa.
Acha que estudar fora te ajudou profissionalmente quando voltou ao Brasil?
VS: Para ser bem honesta, não. O mercado de trabalho na minha área, a psicologia clínica de abordagem psicanalítica, é muito complicado e sem opções e um Master (que revalidei agora como mestrado) não me ajudou em nada para conseguir trabalho na profissão, justamente por ser algo acadêmico e que não é tão valorizado quanto uma especialização comum lato-senso, com foco no profissional. O ganho profissional que tive foi de outra ordem, mas não no quesito emprego.
O que você gostaria de dizer para quem está pretendendo estudar na França?
VS: Tenha paciência, persevere. O processo é longo, trabalhoso, custoso, mas vai dar certo. E tem uma coisa que é importante ter em mente também, é que não é um conto de fadas. Você vai passar por dificuldades, vai se decepcionar com algumas coisas, e esteja preparado para isso. É uma vida, e a não ser que você não precise trabalhar ou estudar e assistir aulas, não vai ser uma vida Hollywoodiana só de viagens, festas e diversão. Vai ter trabalho e estudo e supermercado todo dia e lavanderia e banco e outras coisas pra resolver. Mas no fim tudo vai valer a pena.